domingo, 10 de fevereiro de 2008

Alberto Sampaio, correspondente em Guimarães do jornal "A Província"

Quanto Joaquim Pedro de Oliveira Martins fundou, no Porto, o jornal A Província, convidou o seu amigo Alberto Sampaio para colaborador, como correspondente de Guimarães. Foi nessa condição que o historiador vimaranense acompanhou o conflito entre Braga e Guimarães, despoletado no dia 28 de Novembro de 1885 com um manifestação em Braga contra os procuradores de Guimarães à Junta Geral do Distrito de Braga. A questão entre as duas cidades minhotas agudizar-se-ia de tal modo que Guimarães passou a exigir a sua desanexação do distrito de Braga, passando para o do Porto. Ao longo do conflito, Alberto Sampaio assumiu a defesa dos interesses da sua terra, posição que se reflecte nos textos que vai enviando para “A Província”. Desde cedo, a questão entre Guimarães e Braga ganhou foros de luta partidária, na qual o Partido Progressista, de que o jornal de Oliveira Martins se assumia como porta-voz, se inclinava para o lado dos interesses de Braga. A certa altura, Alberto Sampaio sentindo-se magoado com a diferença de tratamento que o jornal dava às correspondências de Braga e de Guimarães sobre o conflito entre as duas cidades, escreve uma carta a Oliveira Martins em que denota a sua intenção de abandonar as funções de correspondente de A Província.

Meu caro amigo

Creio que me assiste toda a razão, como lhe vou expor. Desde que começou o nosso conflito com Braga, sabe muito bem que tanto as minhas correspondências como as daquela cidade eram colocadas na primeira ou segunda página debaixo do titulo “Conflito entre B. e Gui.es” e portanto tiradas do “correio das províncias”. Assim foi enquanto o gabinete regenerador estava no poder: quando este caiu, não me achava aqui, cheguei no dia 22 e neste mesmo dia escrevi e expedi uma correspondência que foi publicada no N.° 43. Depois de a expedir, recebi o n.º 42 e notei que já tinham mudado o primeiro título pelo de “Notícias de Braga” para a correspondência daquela localidade. Impressionou-me esta mudança e arrependi-me de a ter mandado, por se me afigurar que a questão desagradava agora uma vez que o partido progressista era governo. Era certo todavia que estava ainda na segunda página. No dia seguinte quando recebi o n.º 43 fiquei surpreendido, encontrando-a no “Correio das Províncias” em segundo lugar, quase enterrada nos anúncios. Esta colocação significou para mim e creio para toda a gente, que tal assunto não era do agrado da redacção, do que se me dava aviso por aquela via. Posto que magoado por tal tratamento entendi que me restava simplesmente indicar que tinha compreendido o aviso, o que fiz dirigindo-me, na sua ausência, ao administrador do jornal.

Tencionava logo que o soubesse regressado de Lisboa, escrever-lhe dando-lhe conhecimento da minha resolução e seus motivos.

Infelizmente não tive notícia da sua chegada a tempo de ser o primeiro a escrever. Peço-lhe que examine os n.os indicados e estou certo que me dará razão e que concordará que, dada a sua ausência, não podia proceder de outro modo.

Enfim posto de lado o correspondente da Província, o amigo é sempre o mesmo e dele disporá como sempre.

Alberto Sampaio.

Guimarães: Fev.º 27 [1886]


Em resposta a Alberto Sampaio, Oliveira Martins faria publicar, na primeira página da edição do dia 3 de Março de 1886, uma nota em que afirmava a independência de A Província no conflito que opunha Braga a Guimarães. Este texto servia de introdução a uma nova correspondência de Guimarães, em que Alberto Sampaio defende a “anexação de Guimarães ao distrito do Porto” como única solução possível para o conflito.


BRAGA E GUIMARÃES

Damos em seguida a carta do nosso prezado correspondente e amigo de Guimarães. A Província tem sido neutral nesta questão que sempre considerou administrativa e não política. Neste último terreno a colocaram indiscretamente os nossos adversários, levando a com os seus erros acumulados a um tal ponto do azedume e complicação que, no momento actual, não se poderia encontrar solução satisfatória para ambos os litigantes.

Parece-nos que, procurando bem, se encontraria um terreno de conciliação em que todos os interesses legítimos fossem atendidos, sem protrair um conflito a todos os respeitos inconveniente, quer para o país em geral, quer para a capital do distrito, quer para a briosa o nobre cidade de Guimarães onde o nosso partido tem importantes adesões o numerosas simpatias.

Para que bem se veja quanto esta questão local não é partidária basta dizer que na comissão de vigilância figuram os nomes dos snrs. visconde de Lindoso, Rodrigo Portugal, Domingos Ferreira e outros membros do centro progressista de Guimarães.


* * *

Guimarães, 3 de Março

O desejo da separação deste concelho do distrito de Braga acentua-se com a mesma, se não maior intensidade, como quando manifestou pela primeira vez.

Como ontem, continua a haver a mesma união entre todos os vimaranenses, reunidos numa única vontade. Assim foi desde o princípio, assim tem sido até agora e da mesma maneira será no futuro.

Esta questão estaria já resolvida, há muito tempo e para bem das duas partes, se se não tivessem dado os incidentes que são do conhecimento de todos.

Mas passada a perturbação do primeiro momento, e provado, como tem sido com toda a clareza, que a saída de Guimarães da circunscrição administrativa a que pertence actualmente, não lhe levanta nenhuns embaraços, pois ficará sendo ainda o 5.º distrito do reino e portanto um dos mais ricos e importantes – não havendo nenhuma razão de ordem pública ou particular em contrário do desejo do toda a população deste concelho, constante e incessantemente manifestado há mais do três meses, é fora de dúvida que a persistência mostrará aos poderes públicos a única solução possível, a anexação de Guimarães ao distrito do Porto.

Há sossego em todo o concelho, e mais que nunca são necessárias a serenidade e placidez, para que o processo possa ir seguindo os seus termos até final julgamento. Como ninguém é nem pode ser indiferente, como todos estão unidos no mesmo pensamento, as manifestações deverão ser no futuro, como no passado, ordeiras e sensatas.

[A Província, n.º 51, II ano, Porto, 4 de Março de 1886]

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