domingo, 4 de maio de 2008

Alberto Sampaio na Revista de Guimarães (4)


ESTUDOS DE ECONOMIA RURAL DO MINHO
A cultura do mato

Por toda a parte, nos cimos dos montes e nas ladeiras íngremes, entre as penedias que afloram à superfície, onde nunca poderá chegar a charrua, ou em baixo nos sítios mais magros e pedregosos, de onde jamais tirará qualquer proveito, nascem espontaneamente estes arbustos silvestres e bravios, conhecidos pela denominação geral de “mato”, dando aos montes todo o ano pela persistência das suas pequenas folhas uma cor verde característica e em certas épocas cobrindo-se de bonitas flores amarelas. Comuns a todas as formações graníticas, rudes e intratáveis por causa dos seus espinhos agudos, são, apesar da sua difícil abordagem, uma das mais preciosas produções com que a natureza quis porventura compensar a pobreza inicial destes terrenos, e que o génio da raça, que se fixou no país, soube converter em beneficio dos outros que melhor se prestavam ao cultivo.

É assim em todos os países graníticos, desde o Minho ate à Bretanha: em todos a agricultura recorre àquelas plantas, como a um dos principais elementos fertilizadores e de maior valia que a natureza lhe pôs à disposição.

E, de facto, se viessem a desaparecer, veríamos a produção agrícola do Minho muito reduzida: a região contendo 50% de terras montanhosas, a metade das quais pelo pouco não daria nenhum vegetal de produção directa, nem outro, a não ser este, que pudesse prestar qualquer auxilio à sua lavoura, o lavrador teria então de aplicar às camas dos animais a palha com que actualmente em parte do ano sustenta o gado; e a falta desta deveria ser substituída por ervagens que teria de produzir especialmente para tal fim nas terras onde hoje produz ou grãos ou frutos destinados ao sustento do homem. Se o cultivador minhoto pôde acomodar à produção agrícola todos os cantos aproveitáveis da sua terra, é sobretudo por causa destas sarças agrestes que vegetam até no alto dos montes entre as pedras e que vêem fertilizar os campos dos vales e da meia encosta, trazendo-lhes princípios fertilizantes, que aliás lhe ficariam muito caros: à falta de conhecimentos técnicos positivos, a intuição mostrou-lhe o merecimento económico de tais plantas que se lhe representam com verdade como o mais valioso auxiliar da sua indústria.

in Alberto Sampaio, "Estudos de economia rural do Minho. A cultura do mato", Revista de Guimarães, n.º 3, 1886, p. 146-159.

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